Existe um ensaio fotográfico de Marilyn Monroe muito famoso por ser o seu último, intitulado “the last sitting”, foi realizado em junho de 1962 por Bert Stern apenas seis meses antes de sua morte. Este ensaio fotográfico é famoso por sua mistura de sensualidade, vulnerabilidade e beleza etérea, características que sempre marcaram a imagem da grande estrela da Hollywood clássica diante das câmeras. É possível ver nas fotografias a nudez e o uso de tecidos translúcidos, o que reforça a escolha de estética de delicadeza e intimidade da sessão num misto radiante de melancolia e carisma.
Consigo fazer uma associação entre este ensaio de Marilyn e Heliogabala, a jovem imperadora romana, pelo jogo da sedução, provocação e uso de símbolos de poder e vulnerabilidade. Ambas se destacam por usar o corpo como ferramenta de comunicação simbólica que transcende o simbolismo e alcança dimensões políticas, estéticas e emocionais. Existe um relato, que tomarei aqui a liberdade de chamar de lenda, de que Heliogabala se escondia nua entre as cortinas dos corredores do palácio para provocar os homens, criando um teatro de desejo e poder, brincando com os limites de visibilidade e ocultação, revelação e mistério, da mesma forma que o ensaio de Marilyn evoca essa ambiguidade e mistério através do tecido translúcido estando coberta e ao mesmo tempo exposta convidado ao olhar e ao mesmo tempo controlando o que é revelado, criando uma tensão entre público e privado que é profundamente provocador.
Tanto Heli como Marilyn são figuras que desafiaram as normas e papeis a partir de seus corpos quebrando convenções de gênero e poder, uma no império romano e a outra na indústria hollywoodiana, tensionando o papel feminino no imaginário patriarcal. Navegando entre ser o objeto de desejo e sujeito de sua própria narrativa. Ambas brincaram com a teatralidade, criando performances onde o corpo era o palco, onde a sedução dialogava com a tragédia. Ambas são símbolos que colapsaram sobre o peso de suas próprias intensidades.
O corpo como palco
O uso do corpo como palco como meio de expressão e performance vai para além do físico. É onde desejo, conflito interno, provocações e narrativas sociais se encontram. O corpo de Marilyn era símbolo máximo de feminilidade, sensualidade e desejo. Ela sabia usar gestos, olhares e poses para encantar, mesmo pagando um alto preço emocional por isso. Sua presença pública era uma performance contínua e quanto mais sua imagem era explorada, sua vulnerabilidade era reforçada. Sendo consumida através do ódio ou da admiração até ser esmagada.
Assim também era Heli, seu corpo era um espaço de disputa pessoal, de rebeldia contra o poder imperial e as normas de gênero. Roupas ditas femininas, maquiagem e rituais absurdamente provocativos desestabilizavam as convenções do império romano, unindo luxo, erotismo, espiritualidade e anarquia. Tornado seu corpo político e simbólico.
Tragédia
O uso do corpo como palco levou ao colapso interno de ambas. A exposição constante do corpo não encontrou mais um espaço seguro para elas. Marilyn e Heli eram profundamente sozinhas e seus corpos foram aprisionados em papeis que elas não conseguiram sustentar. Para Heli sua performance de liberdade e rebeldia a levaram ao isolamento e violência, desafiando as normas e seduzindo ela atraiu o ódio e a incompreensão culminando em seu assassinato brutal. Tanto Marilyn como Heli são exemplos de como o corpo pode ser revolucionário e frágil ao mesmo tempo, caminhando no beco perigoso do desejo e no palco da ruína, mas deixando um legado de glória para quem entende suas potencias.
Muito muito muito bom!